Neste
mês, o especial entrevistas do Blog do Dido volta com força total em uma
entrevista surpresa com um nome de peso dentro do Wing Chun (Ving Tsun) em
escala mundial: Si Fu Leo Imamura.
Nascido
em 1963, Si Fu Leo Imamura iniciou seus estudos de Wing Chun no Brasil em 1979.
Tornou-se discípulo do Grão Mestre Moy Yat em 1988 e desde então, tem
vivenciado esta arte marcial no mais amplo sentido da palavra. Atual Lider do Clã
Moy Yat Sang, Si Fu Leo Imamura é referência para boa parte dos praticantes de Wing
Chun no Brasil vindos da década de 80/90 e mesmo para a geração atual. Seu
vasto conhecimento o tornou uma pessoa diferenciada no circulo marcial tanto no
Brasil quanto em vários outros países. Atualmente, Si Fu Leo Imamura,
juntamente com sua esposa, Vanise Imamura, lidera a Moy Yat Ving Tsun Martial Intelligence,
pela incumbência que lhe foi dada pelo Grão Mestre Moy Yat para que se
desenvolvesse uma ferramenta que possibilitasse a salvaguarda do Sistema Wing Chun,
dentro das demandas do Século XXI. Uma curiosidade: Si Fu Leo Imamura é irmão
do famoso ilusionista Issao Imamura,de quem sou grande fã (risos).
Esta
entrevista aconteceu de forma muito espontânea e de certa forma, fugindo da
maneira como se vinha fazendo as entrevistas no Blog do Dido. Quem já tem um
olhar aguçado, pôde perceber nas entrevistas anteriores que, em cada
entrevista, faço apenas oito perguntas (por ser um número cabalístico chinês,
presente em vários aspectos do Sistema Wing Chun tais como ‘faca de oito
cortes, oito chutes, etc...etc...). Dessa vez, não aconteceu assim. A
‘’entrevista’’ aconteceu durante algumas horas de papo informal dentro do inbox
via facebook por sugestão do próprio Si Fu Leo Imamura, o que deixou a conversa
muito mais fluida e natural. Procurei abordar algumas questões para que as
pessoas pudessem entender melhor sobre como é conduzido o trabalho dentro da
Moy Yat Ving Tsun Martial Intelligence, principalmente no que se refere à
inteligência marcial. Espero sinceramente que os nossos amigos leitores
apreciem a entrevista.
Blog do Dido; Como surgiu o interesse pelo Ving Tsun? Como
foi o primeiro contato e quando o sr. iniciou de fato os treinamentos?
Leo Imamura
Meu
interesse por Ving Tsun surgiu com meu contato com Bruce Lee. Honestamente, não
tinha interesse no Kung Fu em geral, apenas o Ving Tsun me interessava. Sua
simplicidade e praticidade me atraiam. Iniciei meus estudos de Ving Tsun em
1979.
Blog
do Dido; Nessa época era dificil
encontrar mestres de Wing Chun no Brasil ? Como o senhor encontrou seu primeiro
Si Fu?
Leo Imamura
Era
muito difícil. Foi o Grão-Mestre Li Wing Kay que me apresentou ao meu primeiro
si fu, seu irmão, Grão-Mestre Li Hon Ki, a quem respeitosamente chamava de
Mestre Kay..
Blog
do Dido; Como foi a ocasião em que o sr. conheceu Grão Mestre Moy Yat?
Leo Imamura
Graças
a uma viagem que fizemos Grão-Mestre Li e eu para China e passamos em New York
antes para visitar o irmão mais velho deles, Albert Lee. Sr. Albert foi meu gai
siu yan (apresentador formal) junto à Família Moy Yat. Isso foi em 1987. Como
dá para perceber devo muito à Familia Li (Lee). Os três irmãos tiveram
importantes papeis na minha vida.
Blog
do Dido; E qual foi sua primeira impressão ao encontrar o Grão Mestre Moy Yat?
Leo Imamura
Uma
pessoa muito distinta das pessoas que conhecia no mundo do Kung Fu. Não parecia
um lutador. Tinha uma fala tranquila e gestos gentis. Fiquei muito
impressionado pelo fato de identificar os 3 instrutores de Mestre Kay apenas
observando meu Siu Nim Tau, a primeira forma do Sistema Ving Tsun.
Blog
do Dido; Como era praticar sob sua supervisão direta?Quais os pontos que o sr.
poderia destacar na transmissão do Sistema Wing Chun através do Grão Mestre Moy
Yat?
Leo Imamura
A Vida
Kung Fu. Não havia aulas. Não tinha nada disso que eu estava acostumado aqui...ginástica...hora
para começar, hora para acabar,
aplicações, exercícios...
O
momento oportuno era muito mais valorizado que o momento programado. Assim, nós
aprendíamos quando estávamos preparados para aprender e não quando o mestre
simplesmente acha que tem que ensinar.
Blog
do Dido: Então era um aprendizado ''full time'', certo?
Leo Imamura ; Certo.
Nos primeiros 3 anos dormi no próprio mo gun (recinto marcial). Depois passei a
dormir na residência de GM Moy Yat. Full time que quero dizer são uma média 16
horas por dia... Mas não de treinamento e sim de Vida Kung Fu.
Blog
do Dido; È bem conhecida uma história em que o sr. teria aprendido os princípios
e os conceitos do biu ji na cozinha do Grão mestre Moy Yat, ...como foi essa
ocasião?
Leo Imamura
Não
me lembro disso... Quem te disse esta história?
Blog
do Dido: eu li em algum lugar...
Leo Imamura
Lembro
que tive acesso ao Biu Ji na casa de Grão-Mestre Moy Yat, mas foi na sala de
estar. Seu filho, Mestre William Moy apresentou-me a listagem e ele acompanhou
o processo sentado no sofá da sala. Recordo que foi a primeira vez que ele me
convidou para jantar na casa dele, mas ainda não foi daquela vez que meu si fu
me convidou para dormir na casa dele.
Blog
do Dido ; Mestre,dentro desse processo vivencial do Wing Chun, como essa forma
tradicional de transmissão foi sendo introduzida no Brasil? Teve grandes
dificuldades com relação as questões do pensamento ocidental versus o
pensamento oriental?
Leo Imamura
Tivemos
muita dificuldade! Nos anos 1980, as pessoas em geral não compreendiam como era
possível aprender sem treinar, sem aprender técnicas, sem fazer uso de
aplicações para ser eficaz. Após mais de 25 anos é possível ver algum resultado
daquilo que as pessoas chamam de “forma tradicional de transmissão” através de
destacados discípulos de nossa família. Mestres como Anderson Maia(MG),
Nataniel Rosa (DF), Julio Camacho (RJ), Fabio Matsushita (SP), Washington
Fonseca (SP), Celso Grande (SP), Ricardo Queiroz (RJ) e tantos outros são
referência de excelência do Ving Tsun no Brasil. A Mestra Ursula Lima (RJ) é
uma referência internacional de representação feminina da nossa arte. Os
Mestres Renato Almeida (EUA), Leandro Godoy (Argentina) e Marcelo Navarro
(Espanha) são importantes expoentes de Ving Tsun em seus respectivos países. Mestre
Fabio Gomes (RJ) é uma referência no trabalho com as Forças Especiais do
Exército, Pacificadores da ONU, BOPE e outras tropas de elite. E com referência
à sua última pergunta, tanto o Mestre Walter Correia (SP) que tem feito este elo entre o pensamento
ocidental e oriental, através da introdução oficial do Ving Tsun na Escola de
Educação Física e Esportes da Universidade de São Paulo, o Mestre Felipe Soares
que tem dedicado ao Ving Tsun Experience que é uma importante interface entre o
mundo das Artes Marciais e a sociedade em geral, como o Mestre Leonardo
Mordente que é autor de importantes obras para o esclarecimento desse tema, são
relevantes exemplos de como é possível superar estas dificuldades.
Blog do Dido; O que o sr.
poderia destacar como sendo o atributo mais importante para que o praticante
tenha um bom entendimento da prática do Wing Chun?
Leo Imamura
O
entendimento do que é Kung Fu.; Sendo o Ving Tsun um sistema de Kung Fu, o
entendimento do que é Kung Fu e do que é um sistema é crucial. Dai vem o aforismo
mais conhecido de Grão-Mestre Moy Yat que não canso de repetir: "Kung Fu
sem sistema não é Kung Fu, Kung Fu que depende de um sistema não é bom Kung
Fu".
Blog
do Dido; E como se dá atualmente o trabalho desenvolvido pela Moy Yat Ving Tsun
Martial Intelligence no Brasil no sentido da transmissão tradicional do Sistema
Wing Chun?
Leo Imamura
Mas
antes de prosseguir, gostaria de saber o que entende por transmissao
tradicional para que eu possa ser mais preciso na resposta...
Blog
do Dido; Quando me refiro a transmissão tradicional, eu digo da importância em
transmitir os conceitos do sistema tais como foram transmitidos pelos antigos
patriarcas, sem no entanto,deixar de dar relevância ao contexto atual, as
mudanças de tempo, local e cultura que provavelmente também influenciam na
transmissão do Sistema Wing Chun, então de como era o trabalho desenvolvido
pela Moy Yat Ving Tsun Martial Intelligence no Brasil em no sentido de dar
continuidade ao legado do Grão-Mestre Moy Yat.
Leo Imamura
O
legado de Grão-Mestre Moy Yat pode ser manifestado através da Denominação Moy
Yat Ving Tsun que é o compromisso de provimento progressivo da Vida Kung Fu aos
seus descendentes no contexto do acesso ao Sistema Ving Tsun. Tal compromisso
tem sido viabilizado através do Programa Moy Yat VIng Tsun de Inteligencia Marcial
que é constituído por um conjunto de instrumentos estratégicos que são
reconhecidos por cada líder de família do Clã Moy Yat. Estes instrumentos
estratégicos atuam em 3 vetores estratégicos:
a. Quanto ao provimento
progressivo da Vida Kung Fu (Sam Faat)
b. Quanto ao reconhecimento
dos descendentes de Grão-Mestre Moy Yat
c. Quanto ao contexto do
acesso ao Sistema Ving Tsun
Blog do Dido; Então existe
todo um processo vivencial que visa preparar para que alguém se torne apto á
futuramente salvaguardar o conhecimento do Sistema Wing Chun, caso queira
ingressar no Clã Moy Yat Sang, por exemplo?
Leo Imamura
Sim.
São 9 instrumentos estratégicos,3 para cada vetor .Cada um com uma
característica própria.
Blog
do Dido; mas isso diz respeito às fases do sistema em si?
Leo Imamura
Acredito
que o que você chama de “fase”, nós chamamos de “domínio (ling wik)”. O Sistema
Ving Tsun tem 6 domínios: Siu Nim Tau, Cham Kiu, Biu Ji, Mui Fa Jong , Luk Dim
Bun Gwan e Baat Jaam Do. Para cada domínio do sistema existe um nível do
programa (Básico, Intermediário, Avançado, Superior Inicial, Superior Medial e
Superior Final) que é constituído de 9 instrumentos estratégicos.
Blog
do Dido: Por que esses instrumentos são
chamados de estratégicos?
Leo Imamura
Por
que eles não são instrumentos quaisquer. São instrumentos estrategicamente
elaborados para contemplar cada vetor estratégico.
Blog
do Dido:Digamos que para o acesso ao Siu Lin Tao (Siu Nim Tau)... Nos três pontos acima, saam
fat, reconhecimento dos descendentes e acesso...
Leo Imamura
Como
já havia dito, Siu Nim Tau é um dos ling wik (domínio) do Sistema Ving Tsun. Quando
os instrumentos estratégicos do Programa Moy Yat Ving Tsun de Inteligência MarciaI
são cumpridos para o Domínio Siu Nim Tau, temos o que chamamos de Nível Básico:
Quanto ao Provimento
Progressivo da Vida Kung Fu os instrumentos estratégicos são:
1. Provimento Monitorado da
Vida Kung Fu
2. Relato Pessoal de Vida
Kung Fu do Si Fu com ênfase na natureza do Domínio Siu Nim Tau
3. Visita Oficial da
Liderança do Clã Moy Yat Sang
Quanto ao Reconhecimento
dos Descendentes de Grão-Mestre Moy Yat os instrumentos estratégicos são:
1. Cerimônia de Iniciação
ao Sistema Ving Tsun
2. Estudo Genealógico de Nível
Básico da Linhagem Moy Yat
3. Seminário de Tutorizacão
do Ving Tsun Experience Nível 1
Por
fim, no vetor estratégico “quanto ao contexto de acesso ao Sistema Ving Tsun”:
1. Momento Programado de
Acesso ao Dominio Siu Nim Tau
2. Encontro sobre o Dominio
Siu Nim Tau
3. Seminário de Introdução
sobre o Processo de Titulação Tutorial da Moy Yat Ving Tsun Martial Intelligence
Blog
do Dido; Em sua opinião, o porquê de existirem tantas linhagens de ving tsun ,
algumas tão semelhantes e outras tão discrepantes, mas muitas delas vindas de Yip
Man? Por exemplo, quando vemos o Siu Nim Tao do Si Fu Chu Shong Ting; ele
executa de uma forma. Quando vemos um outro Si Fu, por exemplo, Lo Man Kan, ele
executa ligeiramente diferente e ainda o William Cheung faz o siu nim tao
completamente diferente dos outros dois e todos eram discípulos de Yip Man...
Leo Imamura
Ah,
isso é normal. Por que você acha que deveria ser igual. Cada pessoa tem o seu
proprio kung fu...
Blog
do Dido;Mas existe a lenda de que SiFu Yip Man ensinava de formas diferentes
pra cada aluno....
não sei se isso teria
embasamento,....
Leo Imamura
Uma
coisa muito importante: o Patriarca Ip Man não ensinava a ninguém...Kung Fu...
Simplesmente por que o Kung Fu só passivel de ser aprendido através do acesso
ao sistema. Este acesso era particularizado de acordo com a circunstância que
cada discípulo estava aprendendo. O que é normal na cultura chnesa. Não sei se
isso que você quis dizer com "ensinar diferente", pois ainda não
entendi bem sua pergunta. Por isso, permita-me fazer uma pergunta: você tem irmãos?
Blog
do Dido; sim, tenho um irmão mais novo...
Ele
é igual a você?
Blog
do Dido; nenhum pouco...rsrs
Leo Imamura
Então
gostaria de fazer uma pergunta; Porque vocês são tão diferentes se são filhos
dos mesmos pais?
Mas existe uma lenda que os
pais fazem filhos diferentes uns dos outros...já ouviu falar disso?
Blog do Dido; (risos)
Não, não...
Leo Imamura
Pois
é...esta pergunta faz sentido para vc?
Blog
do Dido; agora, não....
Leo Imamura
Então
porque pensa que seria diferente no Kung Fu? Daí você vê as discrepâncias da transmissão
na China e aqui no Brasil. Temos expectativas distintas. O nosso entendimento
sobre isso é muito discrepante. Por isso perguntei sobre
o seu entendimento de ‘transmissão tradicional”. Quero deixar claro que discrepância
não é algo ruim. Discrepância basicamente quer dizer que há uma diferença entre um e outro. Não há
nenhum problema nisso. Isso é normal.
Blog
do Dido; Como o sr. vê a divulgação do Wing Chun pelas redes sociais aqui no Brasil?
Elas são satisfatórias em relação à forma como se é divulgado o estilo,ou falta
alguma coisa para melhorar?
Leo Imamura
Não posso dar uma opinião qualificada a respeito, pois acompanho
muito pouco esses grupos virtuais, a não ser quando algum conhecido encaminha
algum post para que eu possa tomar conhecimento. Mas pelo pouco que vi, percebo
que as pessoas opinam de acordo com seu entendimento sobre o Sistema Ving Tsun.
Acho que está bem assim ...uma rede social é um foro aberto, onde as pessoas
falam o que pensam. Por isso, não posso fazer valor de juízo sobre a opinião
das pessoas.
Blog do Dido; Bem,
para finalizar a entrevista, gostaria que o sr. deixasse uma mensagem para os
leitores,que sempre acompanham as entrevistas aqui no blog e alguns endereços
para quem quiser agendar uma visita a alguns dos núcleos...
Leo Imamura: O caminho mais forte é
aquele que acolhe o dos outros. Da mesma forma, a melhor interpretação sobre o
Ving Tsun é aquela que assimila a dos demais. A diversidade é muito importante.
Saber como torná-la uma vantagem estratégica é a arte do estrategista (portanto
do praticante de kung fu também).
Obrigado pela
oportunidade de expressar o que penso.
Contatos; http://www.myvt.org/
Contatos; http://www.myvt.org/
Grande mestre.
ResponderExcluirBoa analogia ele fez para diferenciar as linhagens.
Abraço Dido
Excelente. Grão Mestre Léo Imamura é uma celebridade no mndo do Ving Tsun. Tenho a honra de ser iniciado na arte com ele!
ResponderExcluirOlá Sibaak Márcio!!!
ExcluirEu tenho uma identificação enorme com o Grão Mestre Leo, isso porque iniciei meus treinamentos de maneira não-formal nesta linhagem, com o hoje, SiFu Adilson, discípulo do Mestre Rogério Baeta. E naquele tempo ( por volta de 1998) meu então SiFu tinha muitas revistas e matérias sobre Wing Chun ( Ving Tsun) com o SiFu Leo e muitas vezes nos intervalos de algum exercício, eu parava para ler essas tais matérias, vislumbrando um dia, poder trocar uma idéia com ele.
Algum tempo se passou e eu re-iniciei meus estudos, dessa vez como discípulo particular de meu atual SiFu,SiFu Marcos de Abreu (isso em setembro de 2011) seu irmão mais novo - salvo o engano - de kung fu, de maneira séria e levando isso para a vida. E descobri que da mesma forma que o Mestre Leo também aprendeu a arte de maneira muito próxima ao Grão Mestre Moy Yat, eu também venho aprendendo dessa mesma maneira.
Tanto você, quanto meu primeiro professor, meu atual SiFu e o Grão Mestre Leo Imamura, pra mim, são grandes referências na excelência da transmissão e principalmente da vivência do Ving Tsun...
Uma honra ler seu comentário aqui e espero um dia, entrevistá-lo.
Um super abraço.
Dido