quarta-feira, 4 de abril de 2012

Especial entrevistas ; Professor Augusto Carvalho



Esta entrevista já era pra ter acontecido á mais tempo, mas devido á falta de regularidade para com o Blog - entre outras coisas -  só agora tive tempo hábil pra editar os textos.
E é com uma imensa honra que esse mês,nosso entrevistado é o prof. Augusto Carvalho.
Professor Augusto Carvalho é uma figura bastante conhecida dentro das comunidades do wing chun nacional e sua dedicação para com a arte é realmente inspiradora. Nesta conversa por e-mail,pude-lhe fazer algumas questões - algumas bem polêmicas - onde podemos compreender um pouco mais sobre sua visão e interpretação do estilo wing chun e de sua ramificação atual.

Bem,sem mais delongas, vamos á entrevista!


Blog do Dido - O sr. poderia nos contar como foi seu primeiro contato com o ving tusn?O sr. já praticou em outras linhagens  e como o sr. conheceu seu atual sifu?

Sifu Augusto - Tomei conhecimento do Wing Chun  através de artigos  sobre Bruce Lee, publicados na década de 1970. Iniciei a prática em 1993. Passei por duas linhagens diferentes e muita pesquisa e experiência com outros praticantes até conhecer meu Sifu. Fui apresentado a Sam Hing Fai Chan, pelos meus irmãos Kung Fu, Nilson e Marcio. A Familia Sam Chan iniciou seu trabalho no Brasil em 2008. Hoje, temos quatro Sifu no Brasil: Augusto, Yakko, Marcio e Nilson.
De forma resumida é isso. O que posso acrescentar é que meu envolvimento com artes marciais não se restringe ao Wing Chun. E meu inicio se deu em 1976. Passei por várias experiências, até o momento atual onde ensino: Wing Chun, Jow Ga, Tai Chi Chuan. Além de praticar Karate (faixa marrom) e Jeet Kune Do.


Blog do Dido - Gostaria que o sr. comentasse quais são as principais características,tanto filosóficas,quanto técnicas de sua atual linhagem.

Sifu Augusto - Meu mestre costuma dizer que devemos formar bons cidadãos. Então o elemento marcial é apenas um veículo para esse fim. A prática das rotinas de exercícios e o convívio com o Sifu, levará a formação de uma boa conduta para a vida. Eu ensino a como lidar com os conflitos diários além de meras técnicas de combate corpo a corpo.
Quando alguém me pergunta: “você ensina a lutar?” ou “seu Wing Chun funciona em combate de forma eficiente?” Sempre respondo com outra pergunta.  Pergunto por que a pessoa quer aprender a lutar? Você é militar, polícial, segurança, etc. Faço a pessoa parar e refletir primeiro, o motivo de querer aprender uma arte marcial. Quais suas motivações. Essa primeira conversa já é uma aula.
Em suma, nossa linhagem defende uma prática marcial numa época sem guerras, onde o inimigo é nosso ego (centrismo). Temos de nos libertar do desejo de violência. A prática marcial nos ajuda a ter disciplina e dominar a agressividade. Estamos no Brasil do século 21 e não na China revolucionária de séculos passados.
Estou seguindo o Sifu Sam Chan, que segue seu Sifu Ip Ching, que aprendeu com o pai dele; o Sifu Ip Kai Man. Estou tentando ensinar aqui no Brasil uma cultura de família. De pessoas que viram a guerra e buscam a paz. Nosso Wing Chun é simples, direto e objetivo, como gosto de frisar sempre..
Em tempos de MMA, as pessoas confundem objetivos. Acham que todos devem ser gladiadores do século 21. Temos de entender que existe diferença entre arte marcial, defesa pessoal, esporte de combate,etc. Cada ramo tem seu objetivo especifico. E mesmo dentro de um mesmo seguimento, você encontrará propostas diversificadas. Para mim, todas são válidas.
A arte marcial foi criada pelo ser humano para o ser humano e não o contrário. Então, o mais importante é o ser humano.





Blog do Dido - O ving tsun é uma arte transmitida tradicionalmente através das famílias kung fu,ou clãs,sendo diferentes nos estilos,onde muitas delas se auto-afirmam
a autêntica,verdadeira,mais próxima da raíz,ou original, etc,etc,causando uma grande discordância entre elas. O sr. acredita que poderia haver uma 'unificação' - digamos assim
- entre essas organizações?è possível se chegar á um consenso nesse sentido e na sua opinião,quais são os motivos principais para que haja tanta discordancia entre as familias
ving tsun,existe uma saída para isso?

Sifu Augusto Carvalho - Pergunta complexa.  Sendo objetivo, creio que o motivo é o egoísmo e não vejo uma  saída para esse impasse, ao menos no momento.
Mas gostaria de tecer alguns comentários para expor aqui meu modo de ver a questão.
Sejamos realistas. Atualmente existem vários tipos de Wing Chun. Há, os ditos tradicionalistas, os vanguardistas, os mixados, os inventados, e por aí vai. Nem todos seguem (como disse você) as tradições. Isso gera muitas e gritantes diferenças. E está envolvido aí, interesses financeiros, busca de fama, poder e mais algumas coisas. Sou também Psicanalista e como tal analiso a fonte de tudo isso, na velha questão de cada um querer ser o destaque entre todos. O egocentrismo melhor dizendo. Ou, eu diria  ignorância, imaturidade. Mas tudo isso já existia na China antiga, não é criação nossa. É a característica geral de seres em processo de evolução. Por isso a pratica das artes marciais requer um árduo aprendizado. E o resultado disso é o conceito de Kung Fu, que eu costumo traduzir como excelência.
Particularmente, não acredito em disputas. Penso que há espaço para todos. Cada um que divulgue suas ideias e terá quem o siga. Não precisa convencer todos. Isso é bobagem!
Repito: não vejo saída. Minha saída é me relacionar com quem pensa igual a mim. Que considera as disputas uma grande bobagem e prefere ser feliz em harmonia com os demais. Quem não concorda comigo eu não discuto. Ou quem quer me convencer de sua verdade eu apenas escuto e agradeço.
De minha parte, estou sempre aberto a ouvir e ver. Mas se me faltam com o respeito eu ignoro e continuo meu caminho.
Gostaria muito de ver o povo unido. Mas vejo isso, hoje como utopia.

Blog do Dido - hoje em dia é muito fácil se conseguir,livros,dvds,e-books sobre wing chun pela internet e muitas pessoas se dizem praticantes de wing chun apenas por estar estudando
esse tipo de material.contudo, no ving tusn, um dos aspectos mais importantes dentro do desenvolver da arte é a relação sifu-todai,que propcia até mesmo um aprimoramento do carater
e do sentido de mo duk (virtude marcial). O sr. acha que pro praticante,estudar o ving tusn apenas por essa via,seria um caminho válido?

Sifu Augusto Carvalho - Não aprovo, mas não critico. Acho que as vezes um pouco, é melhor que nada.
Lembro que no inicio de minha busca eu tinha apenas artigos de revistas estrangeiras, e o material sobre Bruce Lee que uma amiga traduzia para mim. Depois, algum material nacional e os livros de Marco Natali. Até que pude de fato treinar com um Sifu.
Eu não aprendi muito com aquelas fontes de informação. Mas foram uteis para satisfazer minha curiosidade inicial e entender melhor meu Sifu. Quando passei a seguir um caminho próprio por cerca de dois anos, eu reuni muito material em livros, vídeos e materiais provindos de diversas fontes. Como eu já não era mais leigo, entendia muito mais fácil certas informações.
Mas só quando tive novamente contato com outros mestres e finalmente meu Mestre Sam Chan é que pude evoluir. Ou seja, vivenciar de fato o Wing Chun.
Em suma, os métodos alternativos podem ajudar. Mas não são completos. Aprender e dominar Wing chun de forma indireta é impossível para mim. Mas não critico quem o faz. Pois não sei qual o objetivo dessa pessoa. Talvez ela more no meio da selva amazônica e queira apenas ter um pouco de conhecimento sobre algo que ela gosta. Eu só seria critico a esta pessoa se ela quisesse ensinar outros com esse tipo de aprendizado. Mas ainda assim, não gosto de me envolver com o as escolhas de terceiros. Cada um que constrói seu próprio karma. E ação gera reação.

Blog do Dido - O sr. poderia nos dar mais detalhes sobre cmo o sr. desenvolve seu trabalho de Jeet kune Do?Como o sr. entrou em contato com essa arte e como vem conduzindo sua transmissão?


Sifu Augusto Carvalho - Esse é um tema mais polêmico.Vou iniciar pelo segundo ponto da pergunta e concluir com a questão inicial.
Meu contato com Bruce Lee, se deu através da série de televisão “The Green Hornet” que passava na TV brasileira como Besouro Verde. Talvez alguém estranhe que eu tenha assistido essa série. Mas é que sou um senhor prestes a completar 49 anos em 25 de abril deste ano. Então já vivi alguma coisa.
Com a morte prematura do Mestre Bruce Lee, o mundo das artes marciais virou um vulcão em atividade. Várias publicações surgiram, Fã Club pelo mundo, imitadores, etc. Assim eu iniciei a ler tudo o que falava sobre Bruce Lee até conhecer uma das pessoas que escrevia em várias revistas nacionais, sobre o assunto. A Professora Maria Antonieta Fernandes, grande amiga a quem rendo aqui homenagem. Antonieta é uma figura singular, tendo ajudado em muito, pessoas como Marco Natali e Leo Imamura em tudo que diz respeito ao “Universo Bruce Lee e JKD”. Além de mim , claro.
Através de Antonieta eu tive acesso a informações que ela conseguia com pessoas como Linda Lee e Dan Inosanto, por exemplo. Numa época em que não existia Internet, tudo era por cartas mesmo. Tive acesso a obras hoje esgotadas e entrevistas inéditas. Além daquilo que se publicava. Mantive contato também, com diversos Fã Club e com outros pesquisadores pelo Brasil.
Essas fontes foram os meios para eu tentar entender o conhecimento teórico do JKD. Quanto a prática, segui os conselhos de Mestre Lee. Eu me “atirei na água”. Fui um adolescente que deu a cara para bater. Dos treze aos vinte anos, mais ou menos, enfrentei muitos oponentes para testar a mim mesmo. Mas como não havia mestres de Kung Fu em minha cidade eu treinava com amigos, oriundos das mais diversas artes. Em pouco tempo eu era o coordenador do grupo e depois instrutor. Desenvolvi em 1990 minha própria versão do JKD.
Mas quando iniciei no Wing Chun deixei de lado este trabalho, e mergulhei de cabeça a entender o Wing Chun. Somente por volta de 2006, com o conhecimento maior do Wing Chun é que me voltei novamente para o JKD e descobri vários “mestres” ensinando por aí. Tentei contato com vários deles, mas descobri que a maioria estava apenas tentando fazer um mistura de varias tecnicas. E cada um se achava o dono do JKD. Após contato com vários ex alunos (diretos) de Bruce Lee com a intenção de treinar com um deles, resolvi montar um grupo de estudos de JKD. Pois considerei que meus anos de pesquisa e prática poderiam ajudar muitas pessoas.
Bem, respondendo a questão inicial. Como faço isso?
Primeiramente quero deixar bem claro, que não ensino  Jeet Kune Do. A proposta do meu grupo é de estudar os fundamentos deixados por Bruce Lee e tentar aplica-los em nossa realidade atual. Ou seja, não imito Bruce Lee. Pois não sou fã de Bruce Lee. Mas um estudioso de sua arte e sua vida. Seu legado. Até por que o puro JKD morreu com Bruce. Podemos nos inspirar em seu trabalho, mas jamais imitar sua forma de expressar. Cada um tem de achar a sua.
Outro ponto: é que o objetivo também, é criar um grupo forte. E com isso fazermos contato com pessoas que tiveram treinamento direto com Bruce ou com ex alunos dele. E uma pessoa que tem me ajudado muito é o meu irmão Kung Fu, o Sifu Yakko Sideratos que está vinculado a escola de Jerry Poteet. Tendo ido treinar nos EUA diretamente com esta linhagem de JKD.
Infelizmente a pessoa que eu mais admirava depois de Bruce, faleceu recentemente. Que era o Sifu Ted Wong. Ele treinou nos últimos anos com Bruce somente JKD. E Ted Wong nunca havia praticado outra arte marcial. Assim, ele não tinha outras influencias. Seu JKD era simples, puro.
Mas a vida continua e vamos em frente como dizia o Mestre Bruce Lee.
Pretendo continuar fazendo intercâmbio com outros instrutores e em breve teremos muitas novidades para os interessados do JKD no Brasil.


Blog do Dido - Uma pergunta bastante comum; Jeet kune do e wing chun são a mesma coisa?

Sifu Augusto Carvalho - Sim e não! Wing Chun Kuen é uma arte marcial chinesa, tradicional. Jeet Kune Do é fruto da experiência de vida de um ex praticante de Wing Chun que enveredou por outros caminhos, em busca da eficiência total em combate. Por outro lado, Jeet Kune Do sem a base do Wing Chun Kuen não existiria. Temos aí um paradoxo digno das artes marciais do extremo oriente. Tudo depende do ponto de vista de quem analisa.



Blog do Dido - gostaria de agradecer imensamente pela atenção e gostaria que o sr. deixasse suas considrações final,bem como seus contatos,para quem quiser conhecer mais e se
aprofundar mais.

Sifu Augusto Carvalho - Eu também gostaria de agradecer ao amigo pela oportunidade dessa entrevista. Desejo de coração que você continue crescendo no Wing Chun com seu Sifu Marcos Abreu, a quem muito admiro.
Minha mensagem final aos leitores desse Blog é que pensem por si mesmos. Escolham seu Sifu não por que ele é famoso, é chinês, é intelectual, é bom de luta, é marketeiro, é falastrão, é ótimo contador de estórias, etc, etc... Escolham seu Sifu por afinidade com a pessoa dele. Vejam se de fato você e seu Sifu podem caminhar juntos por longos anos. Experimente, questione, pense, reflita e decida. Se você achar que poderia chamar seu Sifu de pai, então vá em frente. Mas jamais permita que ninguém queira dominar e escravizar você. Um Sifu, apenas aponta o caminho a seguir. Divide com você a experiência adquirida. Mas jamais é o dono da verdade.
Se alguém quiser me conhecer mais sobre nosso trabalho, basta me escrever no e-mail: carvalho.augusto@gmail.com ou pelo Celular (11) 8284-7818

5 comentários:

  1. Ótimo discurso caro Augusto! Está de parabéns, muito bem colocadas suas palavras!

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  2. Deu uma pena aqui quando acabou a entrevista, Li-a completamente, com muito interesse, Dido tem de aumentar as entrevistas, arrancar mais das pessoas, "meter o dedo na ferida" rs.

    SiFu Augusto, uma pessoa que passei a admirar à medida que fui conhecendo, e a quem devo muito. Olha só que coisa interessante...um cara centrado, calmo, tudo isso é passado na entrevista. É tudo que nós que trilhamos este caminho tão sofrido esperamos ver, um cara com postura de Mestre de verdade! E que bom que outras pessoas demonstram o mesmo aqui, sabe? Nos dá esperança para o futuro do wing chun.

    Os alunos de Sifu Cham estão inaugurando uma coisa inédita aqui no Brasil: o mestre Wing Chun que não é megalomaníaco, que não desdenha das pessoas, que não está interessado em fofoca, em falar mal dos outros, que tem um interesse real nas pessoas e cultiva o respeito, que tem cultura mas não a usa ostensivamente como uma arma. Por trás de todo esse comedimento aí existe uma força, é isso que o mestre deve passar.

    SiFu Augusto, grande entrevista.
    Abraço,

    Marcos.

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  3. Parabens Sifu Augusto, adorei a entrevista!!! `muito bom poder saber mais sobre seus fundamentos, é uma pena q acabou logo.. srrsrr

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  4. Parabens pela entrevista. É sempre muito bom poder saber mais do trabalho de outros profissionais e sua visão sobre o Ving Tsun. Este espaço é muito bom.

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