quarta-feira, 29 de junho de 2011

"Pergunte ao Dido e Debate (polêmico) sobre Wing Chun - Parte um

Devido á grande repercussão dos posts especiais "entrevistas",em especial este ultimo post da série,tenho recebido ligações,e-mails,faz, mensagens engarrafadas e até sinais de fumaça,procurando saber mais sobre este tosco que vos escreve.Então,de forma á esclarecer algumas questões,selecionei algumas (porque realmente,algumas perguntas eram tão inconvenientes que decidi ignorar) e as postarei pra os devidos fins.

Aproveito pra postar um texto escrito pelo sifu Marcos de Abreu( recentemente entrevistado aqui no blog) como um "complemento" e que julgo ser válido para os leitores terem um maior entendimento da família Applied wing chun.O texto foi originalmente postado na comunidade "Wing chun Kung fu" no orkut (nota; como explicado á mim pelo próprio sifu Marcos,o mesmo após esse debate deixou voluntariamente de fazer parte desta comunidade e que ele mesmo foi um dos que mais ajudaram em seu crescimento).Minha decisão em postar o debate se dá pelo fato de que o conteúdo do texto ser bastante contudente e além de outros motivos,para que este blog também possa servir de espaço para o debate sobre nossa arte,como eu explicarei á frente.
O texto está dividido em 2 partes para tornar a leitura mais conveniente e para dar espaço á estréia do espaço "Blog do Dido recomenda", com dicas de dvds,livros, escolas e "apetrechos" gerais, relativos ao Wing Chun e as artes marciais em geral.


                                              PERGUNTE AO DIDO 
                                          ( Ok,perdoem o péssimo título...)



(DIDO,EM FOTO ANTIGA PRACARAMBA)



Questão: " De onde você é e qual a sua idade?"

Dido; "Sou de Recife-PE e tenho quase 30 anos,quase..."

Q.: "Quem foram seus professores e ha quanto tempo faz kung fu?

Dido.: "Comecei no shao lin do norte,com o mestre sebastião cícero,aluno do sifu julio kushida,que por sua vez é aluno direto do mestre Chan Kwok Wai,introdutor do shao lin do norte no país.Eu tinha 14 anos e aos 17 mudei pro ving tsun,com o sifu Adilson na linhagem Moy YAt. Como foi o último aluno á ser aceito em seu Mo-Gun,antes de seu fechmento para que o Adilson completasse seus estudos com o Sifu Rogerio Baeta (Moy Bai DA),passei mais tempo Praticando com meu Si-hing Cabral.


Q.: Você ensina wing chun?


Dido; Pra ensinar,é necessário domínio pleno da arte,o que é diferente de apenas conhecer a arte...eu ainda tenho muita estrada antes de chegar á dominar a arte,portanto, não.


Q.: Porque você começou a escrever sobre WIng Chun?


Dido: Eu senti na pele a falta de se ter um espaço,que ao menos favorecesse um ponto de inicio para as pesquisas sobre Ving Tsun em nosso país (Eu mesmo,até encontrar um professor,sofri pacas!).Não que não existam sites muito bons sobre isso,existem!O belíssimo blog do Pereira por exemplo é um deles e que eu realmente acho primoroso.Mas mesmo esse blog,fala apenas de sua ramificação,o que é mais que natural.De certa forma, não existe um espaço aberto pra um debate amistoso sobre esta arte tão controversa e tão simples,pra entrevistas e informações em que o público possa traçar um perfil de cada escola, através do ponto de vista do mestre,que os auxilie na escolha de uma escola séria.Tirando claro, os fóruns no orkut e afins (mas ali,os assuntos tendem sempre á saírem de foco).Isso exige muito!É preciso ser imparcial,pesquisar muito e saber que nem todo mundo vai concordar com o que você disser.Ou seja,é uma biata responsabilidade,mas eu encaro numa boa.Então,se esse blog servir para este fim,já será uma pequena,mas uma contribuição de qualidade.






DEBATE "POLÊMICO" NA COMUNIDADE ORKUT DEPOIS DA ENTREVISTA SIFU MARCOS PARA O BLOG DO DIDO PARTE 1.


(Texto Original por Sifu MArcos de Abreu)

Olá, amigos, mestres,
Vou responder as perguntas por esta via, o tópico de propagandas, que o colega fake "Bruce" me fez em meu profile profissional. Como estou recebendo perguntas semelhantes por estes dias por conta da entrevista no Blog do Dido achei melhor logo responder por aqui, assim atinjo um número maior de pessoas e me poupa trabalho. Vou usar CAPS apenas para diferenciar as perguntas das minhas respostas, e agradeço e a moderação por deixar as perguntas no ar:
MESTRE DUNCAN, TE FALOU PORQUE O WC DO WILLIAN CHEUNG É DIFERENTE, NAS FORMAS E APLICAÇÕES? ELE FEZ ALGUM COMENTARIO A ESSE RESPEITO?
R - A única menção feita a mim por Sigung Duncan sobre William Cheung foi espontânea e feita alguns anos atrás, ele mencionava que admirava Cheung por sua habilidade e porque era mais velho, e que também admirava Lok Yiu e Tsui Song Ting por eram muito bons em Chi Sao. 
Quanto as diferenças de uma escola para outra, Duncan deu-nos (a mim, Marcelo Florentino e Cláudio Rangel, meus irmãos wing chun mais velhos) a explicação mais simples, quase besta e convincente que já ouvi até hoje: “Yip Man estava se lixando”. 
Ensinava a todos do mesmo jeito e superficialmente, e deixava todos livres para dar sua própria versão das movimentações. Só ensinou como aplicar o Wing Chun mais rigidamente a alguns poucos escolhidos, geralmente quem pagava mais, porque era viciado em ópio, um vício caríssimo, diga-se, e alguns a quem ele realmente amou e ensinou de graça. (Alan Lee disse-nos na China que o Wing Chun que ele aprendeu com Duncan e o que ele aprendeu com Yip Man era exatamente o mesmo, mesmas técnicas). Entretanto, o próprio Wing Chun está estruturado de forma a você poder “montar movimentos”. Eu explico:

Um Tan Sao sozinho, por exemplo, não é uma técnica, mas um elemento técnico (todo Sil Lin Tao é formado destes elementos técnicos isolados ou em conjuntos curtos); se você o coloca junto a um soco ou uma outra defesa e uma base, você pode ter diferentes técnicas. Destarte todas as possibilidades de criação de movimentos, a gente tende a seguir o modo como somos ensinados. Vale lembrar que o modo de chinês de ensinar não segue uma ordem 1, 2 e depois 3 numa linha, mas de modo circular. Assim sendo, quando vejo o William Cheung fazer o “footwork” no Mudjong, trabalho de pernas que aprendi desde no primeiro nível de Wing Chun, não acho que ele esteja inventando nada, apenas aprendeu conteúdos numa ordem diferente ou adaptou de outra forma. Continua sendo o mesmíssimo Wing Chun. Se o cara quer chamar Luk Dim Boon Kwan de Dragon Pole, deixa o cara fazer isso, cada vende um seu peixe do jeito que quer. Dizem que aprendeu de outras escolas também... quem vai saber?

DEVEMOS MOSTRAR A DIFERENCIAÇÃO DE NOSSO TRABALHO, MOSTRANDO COMO A ARTE É E PRA QUE SERVE, E FICARMOS LONGE DO AMBIENTE DE MMA? O SR NÃO VÊ UMA TENTATIVA DE TORNAR O WC MAIS "DE ATAQUE", AMPLIANDO O ARSENAL DA ARTE, PARA COLOCA-LA MAIS COMPETITIVA AOS RINGS?
R - Antes de eu explicar isso tenho de deixar uma coisa bem clara, quando falo que o Wing Chun é para um ambiente de luta aberta e sem regras, não o faço como as pessoas que desconhecem o estilo, que dão desculpas furadas repetidas por seus professores como regras, que não pode chutar no saco, enfiar o dedo no olho etc. Eu vou na técnica, mostro porque a técnica é adaptada para aquele tipo de situação. 

Wing Chun é uma arte em que infelizmente o cara é adestrado para não pensar por si próprio, mas para repetir asneiras vindas da boca do “mestre”, que no Brasil é um carinha que assinou um contrato de uma franquia no sistema de pirâmide e abre dez escolas antes de chegar ao nível superior do estilo, e depois reluta em pagar 30 mil reais para aprender bastão e facas. Artes marciais são nada mais respostas a determinados problemas na luta, dentro de uma cultura da luta e um momento histórico. Estude isso, e você pode entender qualquer arte marcial. Sem segredo, sem conversa fiada. 

Eu não disse que o Wing Chun não possa ser adaptado para MMA. Eu inclusive disse qual seria na minha opinião de quem já praticou outras lutas e já treinou em equipe de MMA em nível competitivo. Eu apenas acho que o Wing Chun é focado demais para um tipo de coisa, e que seria difícil – muito - adaptar para este tipo de competição. Não acho que se deve ficar longe das competições, independente do objetivo principal da luta. Isso porque as lutas mudam e evoluem constantemente, e devemos acompanhar essa mudança, porque o conhecimento de luta de alto nível está aí acessível a todo mundo. 
Mas aí eu te faço uma pergunta: como você vai adaptar algo que nem consegue aplicar na luta? O Duncan tomou um rumo diferente, ele preferiu primeiro fortalecer o Wing Chun usando o próprio Wing Chun. Os caras quando lutam contra lutadores competitivos, usam somente o Wing Chun. E na “trocação”, o nível do nosso Wing Chun é altíssimo, mas isso nunca vai mudar o fato que o soco do Wing Chun vem de baixo para cima, e isso tem um motivo, que é facilitar o contra-ataque. 
.Mas no ringue, suas armas de ataque devem superiores e variadas, então, embora não eu ache que você vai boxear bem usando Wing Chun, num ringue de MMA você vai se preocupar com outros fatores como quedas etc. de forma que você talvez possa adaptar, sim. Mas o Duncan quer fazer isso contra thai kick, e eu particularmente acho que não é o melhor caminho, porque ele acha que todo mundo é talentoso como ele foi contra esse tipo de lutador. Opinião de quem viu de fora...



O SR DISSE OUTRA COISA, COM RELAÇÃO AO SEU ESTILO DE WC: "O PRIMEIRO ASPECTO É A NOÇÃO DE “COBRIR” AO INVÉS DE “BLOQUEAR”. NO WING CHUN GERALMENTE VOCÊ ESPERA O GOLPE VIR E ENTÃO PARÁ-LO. ISSO NÃO FUNCIONA.SEI QUE É DIFÍCIL DE EXPLICAR ISSO POR AQUI...MAS WC NÃO É DE INTERCEPTAÇÃO? NÃO É LOGICO QUE DEVEMOS DETER O GOLPE?COMO VOU COBRIR ALGO QUA AINDA NÃO VEIO?...
R - Para bloquear você tem de ver o golpe. Esperar por ele. Eu estava tomando um piau de um lutador de Thai pois estava tentando aplicar uma técnica específica contra jab-direto. Duncan veio e disse: “Por que você está esperando por ele? Se ficar esperando, vai apanhar sempre, vai esperar por uma mão, ele vai jogar outra”.Você deve atacar também, e quando sentir que vai surgir o ataque, defender a área e bater firme. Você não defende o “golpe”, mas a área exposta, antes que o ataque ocorra.
Ou seja, eu devo decidir fazer a técnica, cobrir o lado exposto e bater. Você deve pensar mais no ataque, e não esperar o cara atacar. Se esperar ver, daqui que o seu olho mande a informação para o seu cérebro e depois para a sua mão, você já apanhou. E se eu não conseguir meu golpe de um lado, eu já tenho de estar treinado para defender o lado que ficou aberto, mas isso não acontece no Wing Chun, você sempre faz um único movimento e diz: - Te peguei. Pegou nada. Vi caras bons enchendo a mão na cara do Muay Thai e logo em seguida o cara enchendo a mão para dar o troco também. Sem uma seqüência para continuar o golpe, o lutador de wing chun fica perdido.

VOCÊS ATACAM SEMPRE COM UMA MÃO PROTEGENDO A LINHA CENTRAL...ISSO É WC...
R - Errado, a mão não protege, “linha” alguma. A mão livre cobre áreas expostas. Entenda, linha central é a menor distância entre você e o adversário. Só. Não fantasie, não crie fórmula, não coloque equações, gravidade etc. Se a mão está na “linha central” quer dizer que eu estou posicionado para continuar golpeando você na menor distância. Todas as artes marciais usam essa noção como referência, só não transformam isso numa reza. E isso não impede ninguém de apanhar, não.
CHUTAM, MAS USAM O KAN SAO COMO PROTEÇÃO, POR EXEMPLO...ISSO É "DO SISTEMA"...
R - Concordo com você, é do sistema. Mas nem todas as escolas fazem isso. Vou te dar um exemplo simplesinho: pegue um vídeo no youtube com bloqueios de Wing Chun...você na maioria das vezes vai ver um tiozinho com uma guarda tradicional parando a perninha do outro frango que está chutando ele. Bonito na teoria. Na prática você deve cobrir, ao mesmo tempo que pisa, outras áreas como cabeça, tronco, porque se o cara não chuta onde você espera, vai a nocaute na hora. E digo mais, na maioria das vezes, você só vai se cobrir, não vai dar tempo de pisar. O chute do cara é um movimento. O seu vai ser: 1. ver. 2. Levantar a perna. 3. abaixar a perna... Tentando bloquear você nunca vai conseguir fazer isso, você deve  “forçar”, o cara a chutar em você no seu tempo. Saca a diferença?

VOCES ATACAM E SE COBREM LOGO...ISSO TAMBÉM É WC...
R - Não, não é, desculpe discordar, não existem seqüências de recuos e saídas quando algo não dá certo na maior parte das escolas. Usual no WC é ficar com as duas mãos na direção do cara, secando ele parecendo um babaca, esperando ele se movimentar, e aí sair fazendo soco corrente e mais um monte bobagem. Aí você cansa antes de colocar sequer um golpe que preste e o outro cara te amassa. No Wing Chun inteligente você deve atacar constantemente, usar chutes e socos de forma combinada, e saber usar o corpo de lado na luta dois a dois para ter variedade de golpes, bem como deve saber usar o corpo de frente quando lutar contra mais de um adversário. Quando um ataque não da certo, temos de ser pacientes e começar tudo de novo, ao invés de ficar jogando golpes no ar a esmo. Nosso jogo é outro.





Em breve, a parte 2




                       BLOG DO DIDO RECOMENDA









Este livro surgiu de um documentário produzido pela BBC de Londres sobre a origem das artes marciais em geral,mas com certo destaque ás artes oriundas do oriente.È uma leitura que nos leva á uma viagem para compreendermos as artes marciais em sua visão axiológica,através de pesquisas de documentos raros e de várias entrevistas. Destaco os boxes com depoimentos dos vários mestres que explicam as características atuais das artes marciais em relação á tradição.





quarta-feira, 22 de junho de 2011

Teoria da Linha central

Este é um (mais um) daqueles assuntos “cabeludos” envolvendo as teorias do Wing Chun e que de tempos em tempos ressurge nos tópicos de discussões - comparáveis  a aquelas discussões de porta de bar de faculdade,onde se discutem Nietchze,Marx,Jung  e que ninguém chega á um consenso – que é a Teoria da linha central.



Na verdade, como em quase tudo o que se refere ao Wing Chun,todo o alarde que se faz em relação á essa teoria se dá por conta das diversas interpretações oriundas  das diferentes linhagens e ramificações.Mas no fim das contas,o mostro não é tão feio quanto parece...




A versão mais conhecida do grande público diz que; “A teoria da linha central é uma linha que passa pelo centro do corpo dividindo-o em dois lados.” mais ou menos como o desenho (tosco e que eu mesmo fiz...rs) abaixo.



(O desenho mostra o praticante em I jee kim yeung mah,postura básica do Wing Chun)


Sim,ok,até ai,nada demais.Além do referencial do centro do corpo,onde cargas dágua isso ajuda na hora do combate e porque isso é tão importante no Wing chun?




Bem,vejamos; Uma coisa é certeza; Se você ficar procurando linha imaginária no adversário,ele te põe pra dormir antes mesmo que você a encontre!Isso é batata!Tendo isto posto,é preciso então termos uma visão mais eficiente desta teoria para que ela venha a lhe ajudar,ao invés de te atrapalhar.

Voltemos ao desenho;




Caso não tenham reparado, o desenho na verdade mostra  2 linhas.Uma que vai da cabeça aos pés,dividindo o corpo ao meio e outra que sai da linha dos ombros,até a extensão dos braços.Isto acaba delimitando um plano,ok?E pra quê serve este plano?



Ele acaba servido apenas como um referencial para um termo bem comum de combate,o que chamamos de “guarda”.Se eu lanço um soco,por exemplo,o meu intuito é fazer com que,usando termos tradicionais “busque a linha central do oponente".Ou seja,que eu atinja o corpo do oponente,sem que seus membros defendam meu golpe.Se ele desvia o soco,então ele “ocupou a linha central”,ou simplesmente fechou a guarda.


Ok. Isso por si só não impede que o oponente não lance ataques em ângulos inesperados e que eu vá usar ataques somente visando o cento do corpo do oponente,nem impede de sermos atingidos,então isso é a linha central???

Não. Como dito,isso é apenas um referencial,NADA MAIS, pra que você tenha noções de linha de cintura,linha alta ou baixa.E mesmo essa noção,não impede que o oponente o atinja...

A teoria da linha central de fato, nada mais é que a menor distancia entre você e o oponente. SÓ E APENAS. Nisto, a efetividade desta teoria está no fato de que “a linha central” entre seu punho (ou pé,ou qualquer outra arma),por exemplo e o alvo esteja na menor distância possível,ou seja,que o ângulo permita que você continue atacando o oponente á partir da menor distância entre você e ele.
Partindo dessa lógica,dá pra perceber que chutar a cabeça do oponente não é tão conveniente,quanto lançar um soco direto.Também percebe-se que a linha central não fica necessariamente "no meio",e que podemos redirecioná-la,para possibilitar um melhor posicionamento para lançarmos um golpe.

O Bruce Lee dá um pequeno exemplo desta teoria (além do conceito de interceptação) neste vídeo abaixo;




Como se vê, em Wing Chun usamos preferencialmente golpes diretos – apesar de existir golpes cruzados – e que não necessitem de nenhum tipo de preparação,cacoete ou seja lá o que for que possa telegrafar o golpe.De onde a mão está, o golpe segue ao alvo mais próximo. Isto é a linha central.


terça-feira, 14 de junho de 2011

Chi Sao - A Alma do Wing Chun

Se há algo que realmente distingue o sistema ving tsun de outros estilos de kung fu, é o treinamento de Chi Sao. Chi Sao significa “mãos pegajosas” (dependendo da ramificação, linhagem e família kung fu, você poderá encontrar outras traduções aproximadas) sendo o termo em inglês comumente usado “sticking hands”. Na verdade o termo que deveria ser o mais usado seria “braços pegajosos”, pois são os braços, e mais precisamente os antebraços que desempenham a função primária do exercício.
Tradicionalmente, o Chi Sao é ensinado assim que terminada a fase SIU NIM TAO. A razão disto é que durante a prática do DAN CHI SAO, ainda na fase SIU NIM TAO, o praticante já deve conhecer, compreender e combinar alguns dos elementos contidos na forma. Estes movimentos devem ser coordenados e combinados posicionando os cotovelos dentro da linha central.
Os antigos SIFUS desejavam desenvolver um exercício que permitisse a um praticante de menor envergadura e força física situar-se em uma posição tático-ofensiva mais favorável e eficiente. Todo esse conjunto deve estar unido á uma posição bem equilibrada, conseqüente do estudo prévio de base.
O Chi Sao permite explicar e pôr em funcionamento as técnicas contidas nas três listagens iniciais do sistema ving tsun, bem como da fase moy fa Jong, sendo que em constante mudança de ritmo e reação.
                                                             


                                                        Rotina de treinamento


DAN CHI SAO   (Tang Chi Sao) fase siu lim tao, forma elementar do exercício Chi Sao
SEUNG CHI SAO   (forma básica)
LUK SAO   (forma básica, relaxamento, exercícios)
LUK SAO   (exercícios específicos, agarramentos, desvios, trappings)
CHI GERK   (exercício de sensibilidade desenvolvida através do contato das pernas)
KUO SAO   (Chi Sao livre)
KUO SAO   (Chi Sao livre com mudanças de base)



Na verdade, o tema “Chi Sao” é realmente muito vasto devido ás inúmeras possibilidades de combinação e recombinação das técnicas, aplicações de energia, entre outros aspectos. A idéia deste artigo é servir como referência inicial para quem quiser pesquisar mais sobre o assunto.

Uma das principais técnicas no treinamento do exercício Chi Sao é chamada “um domina dois”, ressaltando ainda mais a função conjunta do punho e do antebraço no processo de desenvolvimento do exercício. A técnica de Huen Sao é bastante utilizada dentro do Chi Sao por conta de sua efetividade e simplicidade de aplicação.

Forma em Luk Sao


Mas o grande "macete" dentro do exercício de Chi Sao é o desenvolvimento da atenção perceptiva, o que chamamos de “sensibilidade”, ou “percepção sensorial”. Em suma, é tentar prever – mas não de maneira forçada – qual o próximo movimento do parceiro de treino e tentar antecipá-lo. A partir de como o exercício está estruturado, você deve tentar perceber quais as condições do parceiro de treino, percebendo se ele está com estrutura e se há condições para avanços e recuos, através da leitura dos movimentos dele. Portanto, mais importante que ver, é sentir a intenção do companheiro de treino.

 Você também deve perceber quais são suas próprias condições em termos de posicionamento, esforço, ritmo, etc. para possibilitar ações assertivas, ao invés de tentar simplesmente adivinhar o que o oponente vai fazer. Por isso, o ideal é agir de forma natural e relaxada. Relaxamento neste ponto é essencial. O esforço só deve ser feito, ou seja, a energia só deve ser aplicada, no momento exato da ação e de acordo com o movimento proposto. Assim, caso o companheiro de treino tente impor seu ritmo, aumentando ou diminuindo a velocidade, você poderá “manter o controle” das alternâncias em Luk Sao, aplicando seu o esforço de acordo com o esforço do oponente. Tudo isso, também é uma das razões pela qual o Chi Sao é mais convenientemente associado á segunda listagem do sistema Ving Tsun, chamada Chum Kiu, pois a forma enfatiza a importância de prestar atenção ao oponente e o estabelecer da ponte, na tradução da forma, simboliza justamente a via de contato com o oponente, parte integrante de sua estratégia.



Outro ponto importante a se frisar é que o Chi Sao é um exercício com uma finalidade prática específica e que não ensina a lutar efetivamente,apesar dos elementos de combate lá inseridos. Portanto, dentro deste exercício, não há uma relação “vencedor/vencido”, sendo que o exercício de Chi Sao não deve substituir a prática do sparring,nem vice-versa. O Chi Sao também não tem sentido se praticado sozinho, já que seria algo como falar sozinho. Então, percebemos que o Chi Sao serve para o desenvolvimento da “sensibilidade energética”, ou seja, da intuição perceptiva, onde a via de contato entre o oponente e você é estabelecida através do contato dos braços. È um exercício de apuro que vai auxiliar bastante quando o praticante estiver em MAAI SAN JONG ou GONG SAO.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Especial - Entrevistas; Sifu Marcos de Abreu

Dando prosseguimento aos posts especiais de "Entrevistas" com os mais renomados mestres do Wing Chun no Brasil.
E é com imensa honra que o blog do Dido entrevistou este mês,um dos nomes mais conceituados do Wing Chun nacional, o Sifu Marcos Wendell Sales de Abreu,mais conhecido no meio marcial simplesmente como Marcos de Abreu.











Sifu Marcos de Abreu é paulistano, Prof. de Educação Física e Mestre da 9ª geração do Wing Chun Kuen, arte marcial chinesa popularizada graças ao superstar Bruce Lee. Foi o primeiro entre os professores brasileiros a concluir todas as fases de treinamento formal com Mestre Li Hon Ki, introdutor oficial desta luta na América do Sul, de quem foi estudante "às portas fechadas" (Closed Door Student), termo que em chinês que designa aqueles que receberam o ensinamento privativamente no mais alto grau. 

Sua experiência inclui lutas em campeonatos, treinamento na China com a sétima geração e atual Patriarca do clã, Mestre Duncan Leung, e outros mestres da oitava geração. 

É autor do livro KUNG FU WING CHUN, sucesso de vendas no Brasil, Portugal e Espanha pela Editora Escala, além de escrever regularmente na internet sobre o tema. Foi pioneiro por ser o primeiro mestre com formação autentica a criticar abertamente na mídia e em seu primeiro livro o ufanismo da luta. Criticou ainda o messianismo da figura do mestre a alienação dos praticantes, o charlatanismo e a compra e venda de certificados e títulos internacionais, defendendo a evolução técnica profissional e convidando as pessoas a repensarem esta arte marcial deixando o discurso de lado para analisar friamente a técnica e seus objetivos originais.
Mantém seu Mo Koon (ginásio marcial) na terceira maior cidade do país, Salvador, ministrando aulas regulares e particulares, além de formar instrutores de nível internacional pela Associação Applied Wing Chun Brazil, da qual é um dos seus membros fundadores junto a seus irmaos kung fu, Mestres Marcelo Florentino, Claudio Rangel e Alberto França.Nesta entrevista,sifu Marcos fala sem papas na língua sobre sua visão da arte marcial hoje no Brasil e não foge á temas controversos,sempre pontuando suas respostas com total "diretismo" e uma sinceridade raramente vista nos ias de hoje.






Blog do Dido - Na sua visão,qual é a maior diferença entre o wing chun praticado no Brasil de hoje,pro brasil de 10,15 anos atrás? Quais foram as principais mudanças e o porque de suas mudanças?
Sifu Marcos - Antes não havia uma noção de “Família Wing Chun”, isto é, as questões sociais, éticas e filosóficas que vêm junto ao treinamento, as pessoas queriam mesmo era aprender a técnica do Jeet Kune Do por causa da figura do Bruce Lee e seus filmes, e na falta disso o Wing Chun era a opção mais viável. Havia no Brasil alguns chineses e outros poucos brasileiros que haviam treinado determinados conteúdos do sistema e os transmitiam a uns poucos interessados, de forma fechada, geralmente caríssima e o aluno não tinha qualquer garantia de que aquilo que aprendia tinha qualquer procedência, pois na época não havia internet, então a possibilidade de checar informações era limitada. Mestre Marco Natali, grande escritor de artes marciais e pioneiro na difusão da luta no Brasil, por exemplo, jamais completou o sistema, fato admitido por ele mesmo em entrevista na comunidade Orkut Wing Chun Kung Fu.
Já neste período dos últimos 15 anos de que fala alguns brasileiros já estavam fazendo intercâmbio no estrangeiro visando melhorar tecnicamente ou simplesmente trazer um Wing Chun mais tradicional, isto é participar ativamente de uma organização ou família. Isto porque com a internet as pessoas começaram a ter mais acesso a informação sobre escolas e o que havia no panorama internacional sobre a arte. Outros mestres aportaram aqui, convidados ou não por brasileiros e começaram seus trabalhos. A coisa começou a evoluir, embora cada organização tenha objetivos e métodos de trabalho diferentes entre si, quando não díspares, mas acho essa variedade positiva, isso dá mais opções ao público interessado. O problema é que os profissionais vendem muitas vezes mais uma fantasia que a técnica junto com a arte: às vezes cultura chinesa, às vezes fantasias históricas sobre monges super habilidosos, ou o pior de tudo, a defesa pessoal perfeita que resolve tudo. Isso pode colocar indivíduos despreparados técnica e psicologicamente em perigo iminente e isto é simplesmente uma molecagem irresponsável. Tenho visto isso, uma espécie de discurso prosetista e ufanista, em algumas escolas. Ouvi verdadeiros absurdos numa academia de Krav Maga outro dia, e olha que eu conheço muita gente boa nesta arte marcial, que se parece muito com o Wing Chun que é mais antigo. Se você pensar que existem professores sendo formados em demasia ensinando "defesa pessoal" mas que provavelmente não existem nem duas dúzias de mestres de Wing Chun no Brasil, você começa a ficar preocupado...
Blog do Dido - O sr. lançou um livro (Kung Fu Wing Chun) de bastante sucesso no meio marcial nacional e agora já está escrevendo o próximo.Quais são as maiores dificuldades no processo de produção e pesquisa deste que é um dos mais ousados projetos referentes ao wing chun?O que o sr. considera mais importante no fator Motivação na decisão de escrever sobre wing chun?
   

(Capa da Obra escrita por Sifu Marcos; Wing Chun Kung Fu; A arte marcial treinada por Bruce Lee)
SM - Caso eu tivesse de escrever na época do Marco Natali eu teria de comprar material importado, encontrar um praticante autêntico que estivesse no país ou viajar ao exterior para obter informações. Com a internet posso, no exato momento em que dou esta entrevista, checar qualquer informação sobre qualquer ramificação do sistema disponível na rede. Por incrível que pareça não tive dificuldades sobre informação, pois além da internet eu tinha minha própria bagagem de 10 anos como aluno privativo de um Mestre que pertence genuinamente à família Wing Chun, de forma que tenho informações que a maior parte das pessoas desconhece. A dificuldade era justamente escrever para o público leigo. Eu tive nas minhas mãos a chance de mudar aquela propaganda de “melhor estilo de kung fu”, “mais isso, mais aquilo”. Isso queimou e queima a gente o meio marcial.
Eu caí meio que de pára-quedas naquele projeto. O projeto do livro estava emperrado pelas dificuldades do Sifu Alberto França Gomes em enviar material a tempo para o fechamento do mesmo, pois ele tinha apenas enviado parte das fotos, e elas só abordavam o Sil Lin Tao (primeira fase da luta). Assim, o escritor José Augusto Maciel Torres convidou-me a escrever o texto. Eu relutei bastante, porque eu sempre quis fazer algo mais autoral porque tenho uma visão de Wing Chun diferente da que se propaga hoje. O Augusto é amigo do Natali e eu, apesar de fã do Natali como escritor não concordo com a visão de Wing Chun dele e já o criticava na internet, embora sem desrespeitá-lo. Mas o José Augusto veio com um argumento muito forte: “Nós teremos 120 mil cópias em três países. Apesar de ser um dos principais alunos de Li Hon Ki, você é um ilustre desconhecido e, pior, reside no nordeste, e você sabe que as pessoas têm preconceito. Você quer começar a fazer a história do Wing Chun no país ou quer deixar isso para outra pessoa? Você acha que existe realeza no Wing Chun? Todos esses caras são uns filhos da p...”, ele disse. Não tem muita frescura, diz o que pensa, eu também sou assim então escrevi o texto e fiz metade das fotos com meus próprios alunos. Mas eu não apareço nelas. Eu não gosto de tirar fotos.
A motivação que tenho é saber que tive e tenho a chance de realmente mostrar para as pessoas o que é Wing Chun, como funciona, deixando para trás aquele discurso sobre uma luta que resolve tudo em segundos. Meu próximo projeto será totalmente autoral e isso me deixa muito animado. Vou explorar aspectos do Wing Chun totalmente desconhecidos no Brasil e tornar outros mais acessíveis aqueles que já praticam.
Blog do Dido - O sr. não teme que pessoas de má índole ao comprarem seus livros já saiam se auto-intitulando mestres de wing chun e passem  a usar o nome da arte marcial chinesa em beneficio próprio,coisa que o sr. bem sabe,no Brasil,é quase que uma "tradição" haver picaretas em todos os estados e capitais?
SM - Não. A internet tem sido mais usada nisso. Livro não ensina ninguém a lutar. A função do livro é fazer o cara se identificar ou não com aquilo, usando para isso informações honestas que dêem dados ao leitor para fazer seu julgamento da melhor forma possível. Picaretas hoje por incrível que pareça compram certificados no exterior vendidos por instituições em tese acima de qualquer suspeita. O cara passa dez anos treinando uma porcaria, ouvindo coisas como “este golpe mata”, etc. e quando precisa usar a arte ela fica lhe devendo. Felizmente todas as vezes que meus alunos precisaram usar Wing Chun para defesa, recebi um telefonema deles me agradecendo pelas lições. Isso sim me dá orgulho do que faço. Mas Wing Chun também não é só isso, porque pode passar toda a vida sem ter de usar a arte. Então, meus alunos e ex-alunos, alguns irmãos de arte que estudaram com Li Hon Ki, todos participam da minha vida e eu da deles, e no fim das contas isso é a única coisa que a gente leva, as amizades que fazemos, nossos laços fraternos.

(Sifu Marcos e Sitaaigung Duncan Leung)
Blog do Dido - Um assunto bem polêmico diz respeito á falta de lutadores de wing chun em campeonatos como ufc ou mma.Ao que o sr. atribui essa "falta"?Seria realmente necessário haver algum representante do wing chun,seja nacional ou internacional em torneios deste tipo?
SM - Só é polêmico porque as pessoas não conhecem a arte e como ela funciona. Se soubessem, isso não seria uma grande preocupação. Originalmente o Wing Chun é uma luta de contra-ataque. O cara fica lá com uma guarda que é quase um prece de monge budista e quando é atacado reage fulminantemente. É muito parecido com aquilo que chamamos hoje – não gosto muito do termo – defesa pessoal. Então, o soco, os golpes, tudo é voltado para um tipo de ambiente de combate diferente do de competição onde a luta é um espetáculo de agressão que necessitava de dois caras indo para cima um do outro. No ambiente de combate irrestrito, você usa uma mesma defesa de Wing Chun para desarmar um cara de porrete, para defender um soco cruzado ou um chute. Os movimentos são ambivalentes e são ajustados de acordo com o calor do momento. Isto torna difícil um nível de especialização para uma competição de lutas específicas para ringue em alto nível.
Quando estive na China, passei por um treinamento que visava adaptar-nos à luta de ringue. Sigung Duncan Leung (mestre de Li Hon Ki) faz isso desde os anos setenta. Hoje, muitos lutadores de nossa escola entram nas competições, mas o fazem praticamente por conta própria, porque todos tem a convicção de que Wing Chun é para o que eles chamam em inglês de “real fights” e eu tive a sorte de conhecer pessoas experts neste tipo de luta, como o próprio Duncan, e dois de seus principais discípulos, Stephen Faukner e Josh Shwan. Eles não dão desculpas de golpes, regras e isso e aquilo para não lutar, eles se arriscaram nas competições para saber o que rola no cenário da luta profissional. Mais cedo ou mais tarde talvez uma escola consiga produzir um lutador de alto nível para este tipo de luta, mas seguindo a característica original do Wing Chun, muito difícil.
Fazendo uma comparação com o que vi na China, se for adaptar para competição de forma mais profissional, o MMA seria um ambiente melhor que um de K1 ou outra competição do gênero. O Wing Chun é forte nos chutes baixos e golpes de curta distância como cotovelos e joelhos, mas ao contrário do que se faz em outras escolas, o lutador de Wing Chun deve evitar a trocação gratuita, mas os caras acham que Wing Chun é só Chain Punch (Soco Corrente). Se o Wing Chun de nossa escola fosse misturado a uma boa luta de projeção como Judô e algum chão seriamos lutadores mais eficientes.
Blog do Dido -  Quais são os aspectos de maior relevância na escola do sifu Duncan leung?
SM - Só existe um Wing Chun que vem de Yip Man então não gosto de falar das características de nossa escola como algo “melhor” que qualquer outra. Então é o nosso jeito de fazer, e isso é apenas Wing Chun. Então vou me concentrar nas coisas que acho que são diferentes de outras escolas. O primeiro aspecto é a noção de “cobrir” ao invés de “bloquear”. No Wing Chun geralmente você espera o golpe vir e então pará-lo. Isso não funciona. E é por isso que a maior parte das defesas clássicas do próprio Shaolin Wushu não funcionam da maneira como você treina. Duncan ensina que ao sentir que vai ocorrer o ataque você deve cobrir a área com a defesa e entrar com seu contra-ataque firme, antes mesmo que o ataque ocorra. Isso faz uma diferença enorme na hora de colocar as defesas tradicionais em prática.
 O segundo aspecto é a força. As bases de nossa escola dividem o peso igualmente entre as pernas e usam o conceito de “forças em direções opostas” para aumentar a força dos golpes, ou potencializar a força da nossa defesa, porque vamos lutar com pessoas mais altas, fortes e rápidas que nós, o wing chun presupõe que haja algum tipo de vantagem por parte do oponente. Leigos em arte marcial acham que você deve recuar braços e pernas para lança-los com mais força, o que realmente é verdadeiro, mas isso telegrafa o golpe. Em Wing Chun, se queremos um golpe forte puxamos o braço ou perna detrás rapidamente e giramos o corpo. Isso gera força curta e explosiva. Em geral se diz que no Wing Chun não se usa força, mas isso não é verdadeiro, Yip Man nunca disse isso. Combinado ao uso de ângulos defensivos que colocam os membros do oponente sempre em contato com as extremidades de nosso corpo (joelhos, cotovelos), o oponente irá se machucar conosco tanto na defesa quanto no ataque. Por isso nossa escola é também chamada de a “Via do Primeiro Contato”.
 O último aspecto que posso mencionar são o uso combinado de chutes e socos na nossa estratégia para a luta. Ninguém nunca conseguirá usar o Wing Chun plenamente se não fizer isso de forma combinada. isso, segundo a tradição do estilo, equivale a usar o comportamento da serpente; se você a golpeia na cabeça, ela te dá com a cauda, e se você o faz na cauda, ela te golpeia com a cabeça. As pessoas pensam que pelo fato do Wing Chun ser um luta vinda do sul da China prioriza apenas os braços. Isso não é verdadeiro. O Wing Chun possui um número maior de ataques com as pernas que braços, mas poucos mestres tiveram acesso a este aspecto do treinamento, porque Yip Man detestava ensina-lo, o que geralmente fazia quatro anos após o discípulo concluir todo o sistema. Mas o grande mérito do Duncan entretanto é fazer os golpes tradicionais funcionarem na luta, coisa que 99% das escolas não fazem.
Blog do Dido - Em 2009 o sr. junto com outros mestres foram á china para um "curso" onde treinou diretamente com o sifu Duncan Leung.O sr. poderia nos contar alguma passagem marcante desta estadia na china e da convivência com este grande mestre?
SM - Nós tivemos sorte de chegar à China primeiro que os nossos colegas da Europa e USA, de forma que tivemos a chance de conversar ele muitas vezes antes do treinamento começar. Logo percebemos a vitalidade dele, que na época já estava com 68 anos de idade. Ele é polido no trato formal, mas firme e sarcástico. Não tem papas na língua. Falava sem rodeios sobre o que achava de Yip Man, seu mestre, e Bruce Lee, seu parceiro de lutas da juventude. Quando manifestamos o desejo de ir ao túmulo de Yip Man ele disse: “Nunca fui lá. Morreu, morreu.” Mas ele entendeu quando explicamos que Yip Man era para nós mais que uma pessoa, mas um ícone, então ele respeitou isso de mandou-nos para lá com um dos seus amigos mais próximos. Numa de nossas idas de carro de Guangzhou a Foshan, ele estava na direção quando um caminhão de transporte gigantesco quase nos esmagou. Todos nós desorientados depois da frenagem, o carro girou e ato contínuo, Duncan passa seu braço por meu rosto empunhando uma laterna de ataque. Ele jogou a luz fortíssima na cara do motorista do caminhão, que levantou os braços como se dissesse: “não atire”. Então Duncan começou a xingar o cara...em inglês!
Ele nos via no treinamento enquanto trabalhava numa grande mesa, sério e concentrado, de cabeça baixa. Parecia que ele estava alheio a tudo. Mas subitamente, se levantava andava pelo salão e apontava, um a um, nossos defeitos contra os lutadores de Muay Thai contratados para nos ajudar atacando realisticamente. Durante o almoço, nós que havíamos treinado três horas seguidas estávamos famintos. Não sobrava quase nada na mesa. Então, todos iam fazer uma sesta, e depois que todos dormiam, ele se levantava, e ia discretamente fazer seu prato. Isso foi algo que me marcou muito. Por fim, antes de irmos embora, ele foi a nossa casa e nos explicou toda a teoria do Wing Chun, com calma, deixando-nos anotar tudo. Que mais posso dizer? O cara não é só um mestre que pagou X de grana até chegar à faixa preta, ele realmente colocou o pescoço em perigo em lutas mortais para que tenhamos certeza que a técnica funciona por muito tempo ainda. Ele é grande como um Oyama, um Hélio Gracie, dentre outros grandes caras corajosos do passado, mas ele diz que não é “ninguém”. Por isso, treinar sob sua orientação e conviver com ele foi uma das maiores honras que tive em minha vida.
Blog do Dido - Por que o sr. escolheu o wing chun?
SM - Eu não tinha talento natural para fazer o judô ou karatê, minhas duas primeiras artes marciais. Eu tinha medo dos garotos mais fortes durante os combates no karatê especialmente (hoje me arrependo de ter abandonado). Sempre que tentava usar os bloqueios eu ficava com meus braços arranhados e sangrando. Eu então comecei a ler sobre Bruce Lee e um dia decidi que iria aprender Jeet Kune Do e Wing Chun. Você se empolga com o discurso, como todo mundo, então eu entrei naquela de querer virar ninja, o caminho fácil, que era o que o Wing Chun prometia (risos). Eu passei metade da minha vida tentando entender essa arte marcial, passando por cima das mentiras até encontrar minha verdade com a arte, o que só fiz recentemente. Foi uma longa jornada para chegar aonde cheguei, paguei um grande preço, pessoal e profissional, mas não me arrependo de nada.
Blog do Dido - O wing chun se diferencia de outros estilos de artes marciais,além de outras coisas,por ter conceitos bastantes subjetivos e particulares. Mas caso algum praticante de wing chun queria treinar outro estilo de luta,o que seria necessário para que este não venha a "meter os pés pelas mãos" e se perder no meio de tanta informação?
SM - Vou além. Digo, com todas as letras, que justamente pelo fato de o Wing Chun ser um estilo que funciona de forma diferente que o praticante é obrigado a praticar outros estilos, pelo menos para saber como estes funcionam na luta, e deixar seu treino mais realista. No Wing Chun, nada é pré-ajustado, você deve se moldar ao que chega a você. Os vexames que os lutadores de Wing Chun passam nas lutas esportivas vêm simples do fato de eles irem para elas sem saber com o que estão lidando. Se você só defende o soco do lutador de Wing Chun -que você só irá encontrar por aí se topar com um lutador de Aikido ou Krav Maga, convenhamos, lutas também defensivas - como você vai se virar contra um boxeador que vem jabeando maliciosamente? Ou contra um lutador de chão? Apenas não tente misturar o Wing Chun com outra coisa sem antes entende-lo com profundidade. Não dará certo. Se for treinar boxe, pense como boxeador até entender aquilo, e vice-versa.
Blog do Dido - Gostaria de agradecer pela honra de entrevistá-lo e gostaria que o sr. deixasse uma mensagem final para os leitores,bem como seus contatos para quem quiser conhecer melhor e se aprofundar no wing chun.
 SM - A mensagem que deixo é a conclusão tiro destes anos todos de treinamento: Se você realmente que algo para sua vida, e estiver disposto a pagar o preço por isto, arrisque, pois tudo vai colaborar para que você consiga chegar onde quer. As pessoas podem até falar mal de você ou não te respeitarem, mas ninguém tira o conhecimento de você, aquilo será seu pela eternidade. E você se torna o resultado de seu empenho, você se constrói como ser humano e artista marcial. Mas se você não arrisca, não vai a lugar algum. Então, para quem quer treinar Wing Chun e acha que não tem físico nem habilidades especiais, eu digo: esta arte marcial é para você, se você se dispuser a arriscar no treinamento, porque seguimos uma técnica. Você vai ganhar capacidade de defesa, com ela virá a confiança e sua auto-estima vai melhorar. Mas se quiser uma arte marcial só para conversar sobre história das artes marciais (não que isso também não seja legal) e filosofar sobre ser guerreiro, seu lugar não é conosco. Numa das conversas que Duncan teve com seus lutadores após o sparring, ele disse: “No dia em que virem que o medo não pode vence-los, não haverá limites para vocês”. Concordo com ele.
SiFu Marcos Abreu
Nona Geração Wing Chun Kuen Phai
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